Uma questão polêmica e histórica é a cobrança de laudêmio.  Laudêmio é uma taxa paga nos contratos de enfiteuse ou aforamento. A enfiteuse é um contrato perpétuo no qual o proprietário ‘arrenda’ as terras a um enfiteuta (espécie de arrendatário) que por sua vez deve pagar uma taxa de ocupação anual (foro) de 1,5% e o laudêmio de 2,5% quando vender o imóvel. Além das taxas, a Igreja tem preferência na compra do domínio útil do imóvel e o enfiteuta pode adquirir a propriedade pagando um resgate de 17,5% do valor do imóvel. Por exemplo, no final dos anos 60, cerca de 70% da área do município de Salvador pertencia a Ordens religiosas católicas, algumas famílias nobres e Prefeitura. Nessa década, Dom Eugênio Sales encorajou a formação de Pastorais da Terra para ser um contra-ponto aos movimentos socialistas pois 60% da população brasileira morava na zona rural.

Em 1922, Pio XI assumiu decidido a resolver a “questão romana” (a disputa gerada com a anexação dos estados papais pela Itália) como forma de solucionar os problemas econômicos da Santa Sé. Dito e feito. Em 1929, o secretário de estado do Vaticano e o ditador Benito Mussolini firmaram o Tratado de Latrão. A Itália reconhecia o Estado soberano e pagava 750 milhões de liras em dinheiro e 1 bilhão em bônus do governo para compensar as perdas territoriais. Graças à indenização, a recém-criada Cidade do Vaticano virou um canteiro de obras. E tomou a feição atual. Nos anos 1930, para driblar os efeitos do crack de Wall Street, o Vaticano começou a “globalizar” seus investimentos. A participação em empresas dentro da Itália também cresceu.

Problemas ligados à administração financeira não são exclusivos dos católicos, claro (vide a condenação dos líderes da evangélica Renascer), mas o mesmo sigilo de Roma se repete pelo mundo. Na Alemanha, o cientista político Carsten Frerk tardou anos para apurar a arrecadação das dioceses católicas e protestantes. Concluiu em 2009 que as paróquias alemãs tinham 200 bilhões de euros em patrimônio. E receberam 9,3 bilhões em taxas. “Com o chamado imposto da Igreja, cerca de 9% do que os católicos declarados pagam de imposto de renda ao Estado vai para a Igreja”, afirma, relatando ter sido “muito difícil” concluir o levantamento. No Brasil, a CNBB tampouco forneceu detalhes de suas finanças.

A Igreja da Inglaterra sofreu uma perda de 40 milhões de libras num investimento num complexo de apartamentos em Nova Iorque. A Igreja fez o investimento em 2007, no auge da bolha imobiliária, segundo o Times. Este investimento da Igreja é o mesmo que consta de uma notícia do jornal O Globo (Condomínio em NY volta para credores, 26/1/2010):

  • Os donos do Stuyvesant Town and Peter Cooper Village, o supercondomínio de classe média em frente ao East River, em Manhattan, devolveram a propriedade aos credores que financiaram a reforma do projeto. A decisão das firmas Tishman Speyer Properties e BlackRock Realty ocorre quatro anos depois da aquisição por US$4,5 bilhões do complexo de 110 prédios e 11.227 apartamentos, na operação imobiliária desse tipo mais cara da história dos EUA. A dívida chega a US$3 bilhões.

Recentemente, os vereadores de Belo Horizonte autorizaram a venda de trechos de três ruas no Bairro São Cristóvão, na Região Nordeste, para dar lugar a um novo templo da Igreja Batista da Lagoinha. Com 23 votos favoráveis, a proposta foi aprovada na Câmara Municipal em segundo turno e caberá agora ao prefeito Marcio Lacerda (PSB) sancioná-la. Se o projeto virar lei, duas casas localizadas da Rua Ipê ficarão ilhadas com a construção da igreja. O autor da matéria, que recebeu 21 assinaturas, vereador João Oscar (PRP), lavou as mãos e jogou para a prefeitura a responsabilidade de definir a situação dos moradores, contrariando o compromisso que havia assumido de só colocar o texto em votação depois de resolvida essa questão.

A intenção é construir no trecho da Rua Ipê e nas ruas não implantadas Serra Negra e Samuel Salles Barbosa um novo templo da Igreja Batista da Lagoinha, com capacidade para 30 mil pessoas. Na justificativa do texto, João Oscar alega que as ruas “estão totalmente inseridas no perímetro de área particular de propriedade da Igreja Batista da Lagoinha”, ignorando, no entanto, a existência dos imóveis de número 514 e 498, localizados na Rua Ipê. “Esse é um projeto autorizativo. A prefeitura é que terá de resolver com os moradores, caso ache conveniente”, ressaltou o parlamentar, justificando que foi informado da possibilidade de os imóveis terem saída para outra rua. O engenheiro Raickson Costa, que há 51 anos mora na via, ficou surpreso ao saber da aprovação da matéria. “É um absurdo. O vereador se comprometeu com a gente a não votar”, ressaltou. Ele e seu primo Edvaldo Costa, que mora na casa ao lado, já sofrem com a invasão da igreja. O fato é que o espaço público – onde há inclusive postes demonstrando a existência de ruas – já virou estacionamento da igreja antes mesmo de ser vendido. Raickson nasceu na casa da Rua Ipê, onde morava com o pai, artista plástico. Para Edvaldo, que foi para lá com 21 anos, o imóvel tem um significado ainda mais especial: ele faz do espaço ateliê para a confecção de peças sacras.

O projeto de lei que vai beneficiar os evangélicos estabelece o parcelamento do pagamento, com correção pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e juros de 1% ao mês. A proposta de João Oscar também autoriza o município a receber como pagamento pelo terreno ocupado um imóvel de valor menor, desde que a diferença em relação ao preço da área vendida seja paga pelo comprador. Apesar de a Lei Orgânica da capital prever que cabe ao prefeito a administração dos bens municipais, tendo suas decisões apenas endossadas pelo Legislativo, um projeto parecido com o do vereador João Oscar já passou na Casa. De autoria do vereador Silvinho Rezende (PT) e de cinco colegas, o projeto que virou lei em 2011 doou um terreno da prefeitura para a Matriz de Santo Antônio, em Venda Nova. Na justificativa, Silvinho destaca que a instituição “apresenta um núcleo de formação cristã, humanística e de cidadania”.

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