Em um estudo, publicado no periódico American Anthropologist, pesquisadores fizeram um verdadeiro ‘censo’ do beijo. Afinal, beijar é humano? Estudos anteriores que afirmavam que ‘beijar é universal’ agrupavam o beijo sexual/romântico com beijos mais sociais, entre pais e filhos. E, obviamente, as coisas são diferentes.

Então os cientistas analisaram dados de alguns grandes estudos anteriores que analisavam várias culturas humanas e contataram etnógrafos para perguntar se, em seu trabalho de campo, eles haviam testemunhado o beijo romântico/sexual. No total, 168 culturas de vários cantos do mundo foram pesquisadas.

E o resultado foi impressionante: em 54% das culturas pesquisadas não havia evidência de beijos românticos. “Acreditamos que o etnocentrismo ocidental, a crença que um de nossos comportamentos prazerosos seria humano, pode ter criado essa ideia de que o beijo é universal”, eles escrevem.

Mas qual é a diferença entre culturas que têm o beijo e aquelas que não têm o hábito? Uma variável comum foi a estratificação da sociedade. O beijo romântico é mais comum em sociedades complexas, não nas mais simples. Ainda não se sabe, no entanto, por que ou se (afinal, não sabemos se a relação é direta) a estrutura social mais rígida pode promover o beijo romântico.

The study found that out of 168 cultures from around the world, 46 per cent of them kiss in the romantic sense. Pictured is the percentage of countries in which kissing is present, or lacking, in each region around the world

O ato de beijar está presente em praticamente todas as sociedades humanas, e é praticado até por alguns animais, como chimpanzés e bonobos, mas não com a mesma importância – ou intensidade – que os seres humanos atribuem ao ato. Para os estudiosos do comportamento humano, existem três teorias capazes de explicar este fato: beijos podem provocar desejo sexual, ajudam a consolidar relacionamentos ou são um teste para potenciais parceiros.

Pesquisadores do departamento de psicologia experimental da Universidade de Oxford, no Reino Unido, encontraram evidências de que a última hipótese seria a mais correta. Eles criaram uma pesquisa online sobre a importância do beijo em relacionamentos curtos e longos, que foi respondida por 900 adultos, dos quais cerca de dois terços eram do sexo feminino.

Resultados – Conforme o esperado, a pesquisa mostrou que as mulheres valorizavam mais o beijo do que os homens. Porém, os homens que se consideravam mais atraentes ou que tinham muitas parceiras também deram mais importância ao beijo. Para os autores, isso acontece porque mulheres e homens que se consideram mais atraentes tendem a ser mais seletivos em relação a seus parceiros. Isso porque, para as mulheres, ter filhos representa um grande investimento de sua vida e sua saúde, por isso elas desejam escolher o parceiro certo. Quanto aos homens atraentes, a grande quantidade de escolhas possíveis faz com que seja preciso um modo de “selecionar” as parceiras – e esse seria o papel do beijo.

No Japão, o beijo é tido como parte das preliminares que antecedem o sexo e só deve ocorrer entre quatro paredes. Só pra você ter uma ideia do quanto o beijo é tabu no Japão, em 1920 foi proibido beijar em público. Só voltou a ser legalizado com o pós-guerra, durante a ocupação americana em 1945. Os brasileiros e a maioria dos ocidentais encaram o beijo entre um casal apaixonado (ou nem tão apaixonado assim) como algo natural, normal e corriqueiro, afinal, beijar não tem nada de mais. Mas no Japão o beijo é encarado como se fosse um tabu e você dificilmente verá um casal japonês se beijando em público.

Na China, por exemplo, uma expressão similar de afeto consiste em esfregar o nariz contra o rosto de outra pessoa. Em outras culturas orientais se beijar não é comum. Nos países do Sudeste Asiático o beijo “entre narizes” é a forma mais comum de afeto e o costume ocidental de beijar na boca é frequentemente reservado para as preliminares sexuais.

O beijo é comum no contexto religioso. Em períodos anteriores ao Cristianismo ou ao Islamismo o beijo tornou-se um gesto ritual e ainda é tratado como tal em certos costumes, como quando se “beija o pé do Papa, relíquias, ou o anel de um bispo.” No Judaísmo, o beijo de livros de oração, como a Torah, juntamente com o beijo em mantos de oração, também é comum. Crawley observa que foi “muito significativo o elemento carinhoso na religião” ao dar uma parcela tão importante ao beijo como parte de seu ritual. No Cristianismo, aquele que havia sido batizado era beijado pelo celebrante após a cerimônia e o uso do gesto foi estendido até mesmo como uma saudação aos santos e heróis religiosos.

No, Romantic Kissing Is Not Universal Across All Cultures