Brasileiros tornaram o país o quarto maior cliente de contas em paraísos fiscais, segundo relatório da Tax Justice Network . Cerca de US$ 520 bilhões (ou mais de R$ 1 trilhão) foram depositados de 1970 até 2010  nessas contas, onde se pode guardar dinheiro em razoável sigilo, sem ter de responder a muitas perguntas, nem pagar imposto. O valor equivale a pouco mais de 20% do PIB (Produto Interno Bruto) oficial brasileiro. De acordo com o estudo, o tamanho da fuga de capitais do país é maior do que a dívida externa acumulada no período, de US$ 324,5 bilhões.

O documento foi escrito pelo economista James Henry para a Tax Justice Network, organização independente, focada nesse tipo de levantamento, que surgiu em 2003 no Parlamento britânico. Henry cruzou dados do Banco de Compensações Internacionais, do FMI (Fundo Monetário Internacional), do Banco Mundial e de governos para chegar aos valores, segundo informações da BBC. No ranking de países elaborado pela organização, o Brasil perde apenas para a China (US$ 1,2 trilhão), a Rússia (US$ 779 bilhões) e a Coreia do Sul (US$ 779 bilhões). Na América Latina, além do Brasil, o México, a Argentina e a Venezuela estão entre os 20 que mais enviaram dinheiro a paraísos fiscais. Ao todo, ao menos US$ 21 trilhões não contabilizados estão depositados nessas contas, diz o documento.

No dia 05 de junho, o Senado Federal brasileiro aprovou lei que visa tratar de forma mais rigorosa o crime de lavagem de dinheiro. Com a nova regulamentação, que modernizou a Lei 9.613/1998, qualquer recurso vindo de atividade ilícita poderá ser enquadrado como esse tipo de crime. Além disso, os chamados “laranjas”, parentes ou demais pessoas envolvidas com o acusado, também poderão ter seus bens confiscados no caso de comprovação do crime.

“A maior parte da renda de investimento perdida pelos países foi recebida por elites privadas de nações em desenvolvimento, que tinham contas em bancos no exterior, mas nunca declaravam em seus países a renda recebida”, disse Henry no relatório.

As empresas petrolíferas criaram, nos anos 60, um esquema para fugir aos impostos que também servia para pagar o mínimo aos países de onde extraíam o crude. Para evitar as consequências de acidentes no transporte marítimo tinham idealizado o truque do país com bandeira de conveniência (Libéria, Panamá…). Uma empresa fantasma com sede nestes países fretava o petroleiro e a empresa petrolífera (Standard Oil ou qualquer outra) vendia o crude à empresa de transportes. Se acontecia um desastre, como o do Exon Baldez, os responsáveis eram companhias fantasmas sem património que nada tinham a perder. Com isso as petrolíferas evitavam enormes despesas com seguros. O sistema era permitido pelas agências internacionais e pelos Estados, pois desta forma o petróleo ficava mais barato.

No início dos anos 90 os grandes bancos americanos criaram fundos de investimento, especializados na dívida pública a curto prazo, de “países emergentes”, em dólares (estes fundos eram diferentes dos que actualmente se conhecem como tal). Os governos argentino, brasileiro e mexicano (promotores de reformas e normas que facilitavam e promoviam as fugas de capitais, fugas essas que deixavam exausta a fazenda pública) endividaram-se alegremente a curto prazo a níveis inverosímeis. Era o boom dos anos 90, o da euforia financeira que não via risco em nenhuma operação. Os Fundos de investimento proliferaram como cogumelos e com eles os paraísos fiscais ligados a estas operações. Os paraísos fiscais reciclavam os dólares da máfia, o narcotráfico, a cleptocracia russa, de Pinochet e congéneres, dos impostos evadidos… para emprestá-los aos países emergentes.

O boom que registraram os países-paraíso, como o Luxemburgo, Liechtenstein, Andorra, Panamá, etc., levou a uma verdadeira proliferação deste tipo de mercados. O mais avançado neste campo são os paraísos fiscais localizados em países virtuais como The Dominion de Melchizedek ou o Reino de Enenkio, que alegam estar situados em atóis da Micronésia, mas que graças às suas operações online “trabalham” com a mesma eficácia ou mais que a dos seus congéneres materiais, num mundo onde a virtualidade é um valor em alta.

“Um banco, por exemplo, junta numa conta 10 milhões de euros de vários clientes na Alemanha e manda para o Liechtenstein como se fossem próprios, sem nomes. Meses depois, envia uma nota esclarecendo de quem é cada parte. O banco do Liechtenstein cria então uma fundação numerada para cada cliente. Como só o banco e o cliente sabem de quem é a fundação, o sistema é fácil, limpo e opaco ao fisco”. O principado do Liechteistein tem mais do dobro de empresas que cidadãos. 35.000 habitantes e 80.000 empresas, muitas das quais reportam como domicílio uma caixa postal. No Liechtenstein, país que tem 33.000 habitantes, já há mais de 50.000 fundações (stieftung).

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