Em um pleito que a princípio se apresentava como uma disputa entre representantes do setor ultraconservador principalista islâmico próximo ao líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei, Rohani surgiu como a figura aglutinadora dos votos moderados, dos reformistas desencantados e de muitos eleitores alheios ao sistema.

Por fim, este clérigo muçulmano xiita, de 64 anos, com um longo histórico revolucionário, conseguiu a vitória com 18.613.329 votos dos 36.704.156 depositados nas urnas, dos quais 35.458.747 foram válidos, segundo o ministro do Interior, Mostafa Mohamad Najjar.

O segundo colocado foi o prefeito de Teerã, o conservador Mohammad Baqer Qalibaf, mas ele recebeu menos de um terço dos votos de Rohani. Depois, veio o ultraconservador Saeed Jalili, com cerca de 10%. A Justiça eleitoral disse que o comparecimento na votação de sexta-feira passada foi de 80%.

Ex-negociador nuclear, Rohani criticou ao longo da campanha o isolamento do Irã provocado pela retórica radical de líderes como Ahmadinejad e defendeu “uma relação construtiva com o mundo”. Ele também bateu de frente com os conservadores em temas como os direitos das mulheres, prometendo criar um ministério para promover igualdade de oportunidades de trabalho.

“Tenho dificuldades em imaginar o sistema da república islâmica convivendo com um presidente Rohani. Como ele é apoiado pelos reformistas e centristas, trata-se de uma figura que em nada agrada ao líder supremo”, disse ao Estado Ali Vaez, analista de Irã no centro Crisis Group. “A oposição perdeu a rede de poder que tinha até 2009, alguns de seus líderes estão em prisão domiciliar e seus jornais acabaram fechados.”

No islamismo xiita, o imã termo é aplicado para a pessoa que é o líder político e religioso. Ele deve ser descendente de Ali e Fátima (o genro e filha do Profeta Maomé).

QUEM VOTA?

O país tem cerca de 50 milhões de eleitores aptos a votar, o equivalente a toda a população acima de 18 anos, homens e mulheres de qualquer grupo étnico (persas, azeris, curdos, etc) ou religioso (muçulmanos, judeus, cristãos, zoroastras e bah’aís). O voto não é obrigatório, mas os iranianos adoram política e acabam sempre comparecendo às urnas em grande número. A campanha para a última eleição, há quatro anos, eletrizou a população, e a participação foi de 80%. Em 2005, antes o clima era mais morno, mas ainda assim 60% dos eleitores votaram. Para o regime, quanto mais alto o comparecimento, maior a legitimidade popular do Estado teocrático fundado com a revolução de 1979.

sistema político IrãNos meios conservadores alinhados ao regime, o voto é visto como uma obrigação religiosa. Neste ano, o regime fez coincidir a eleição para presidente e para vereador, voto mais importante em algumas cidades do interior. Unir as duas votações denota um esforço das autoridades para obter a participação mais alta possível.

COMO É A VOTAÇÃO?

A votação é secreta e acontece em centenas de escolas e mesquitas em todo o país, dos bairros mais chiques de Teerã até as ilhas no golfo Pérsico, passando pelos povoados perdidos nas montanhas do Curdistão. Não há zonas eleitorais, ou seja que todo mundo pode votar onde quiser. O eleitor se apresenta, mostra um documento de identidade e mergulha o dedo indicador na tinta para evitar repetição de votos.

Resultados são anunciados pelo Ministério do Interior algumas horas após o fechamento das urnas. Se ninguém levar 50% + 1 dos votos, haverá segundo turno, uma semana após o primeiro. A posse será no início de agosto de 2013.

Mulheres iranianas esperam em fila para votar, em um templo da cidade sagrada de Qom; país vai às urnas decidir o sucessor do presidente Mahmoud Ahmadinejad (Seda Ravandi/AFP)

QUEM FORAM OS CANDIDATOS DA VEZ?

Após duas desistências na reta final da campanha, seis candidatos estavam na briga. Os principais são três conservadores (Mohamad Qalibaf, prefeito de Teerã; Ali Akbar Velayati, assessor diplomático do líder supremo; e Said Jalili, chefe negociador nuclear) e um clérigo centrista (Hasan Rowhani, ex-negociador nuclear) que se tornou a opção da oposição reformista. Num reflexo das sutilezas da política iraniana, o candidato mais radical é um diplomata (Jalili) e o mais moderado, um mulá (Rowhani).

Corriam por fora um ex-comandante militar (Mohsen Rezaee) e um ex-ministro dos Correios (Mohamad Gharazi).

TODO MUNDO PODE CONCORRER À PRESIDÊNCIA?

Em tese, qualquer iraniano nato, muçulmano xiita, maior de idade, com pós graduação e sem ficha policial pode concorrer. Basta juntar RG, fotos 3 x 4 e currículo e levar a papelada ao Ministério do Interior no mês que antecede a eleição. Neste ano, quase 700 pessoas se registraram, de estudantes a malucos beleza. Mas há uma filtragem rigorosa por parte do regime. Quem avalia as candidaturas é o Conselho de Guardiães da Revolução, formado por seis juristas e seis teólogos encarregados de avaliar a conformidade dos presidenciáveis aos ideais islâmicos da revolução de 1979. Mulheres podem se candidatar, mas nenhuma até hoje conseguiu ser aprovada pelo conselho.

No fundo, o conselho acaba refletindo a vontade do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, o homem que mais manda no Irã. Como Ahmadinejad deu muito trabalho a Khamenei nos últimos anos, contestando sua autoridade e pregando até mesmo, pasme, uma relação direta com Deus, o regime desta vez só liberou candidatos vistos como irrestritatamente leais ao sistema teocrático.

COMO SÃO AS CAMPANHAS?

A maior particularidade das campanhas no Irã é sua curta duração. O prazo entre o anúncio dos nomes aprovados pelo Conselho de Guardiães da Revolução e o dia do voto não passa de algumas semanas. Nesta campanha, Teerã só passou a ter clima de eleição uma semana antes do voto. Há cartazes por toda a cidade, distribuição de panfletos, carros de som, musiquinhas de candidatos, passeatas e comícios. A disputa monopoliza conversas nos mais variados meios sociais. Como os iranianos adoram ter opinião sobre tudo, até quem não vai votar gosta de dar pitaco.

Não há financiamento público de campanhas. Candidatos dependem de doações, que são ilimitadas. Cada presidenciável teve nas últimas semanas 360 minutos gratuitos na TV estatal, incluindo espaço para documentários e entrevistas. Além disso, tiveram quatro horas na rádio estatal.

Iran_Population_1880-2005