Com a chegada do urbanista francês Alfred Agache (1875-1959), em 1927, o fim das favelas foi oficialmente arquitetado. O prefeito Antônio Prado Júnior (1880-1955) o convidara para elaborar um projeto que abordasse a cidade como um todo, um sistema, um corpo integrado. Esse pensamento sobre seu espaço diferia das meras ações pontuais de embelezamento e higiene de outrora. Agache justificou a destruição das favelas “não só sob o ponto de vista da ordem social e da segurança, como sob o ponto de vista da higiene geral da cidade, sem falar da estética”.
Ele recebera influência do City Beautiful Movement que foi uma reforma arquitetônica americana surgida entre 1890 e 1900 com a intenção de revitalizar e tornar mais emblemáticos os espaços públicos das cidades americanas. O movimento floresceu em Chicago, Detroit e Washington. No carnaval de 1935, a irmã de Carmem Miranda, Aurora Miranda, e André Filho gravam a música “Cidade Maravilhosa”. André Filho compõe a música em 1934 e a inscreve para o concurso de marchinhas de carnaval de 1935.
Elaborou planos para Dunquerque (1912), Casablanca (1913), Creil (1925), Poitiers (1926), Istambul e para diversas cidades brasileiras, destacando-se o plano do Rio de Janeiro, tendo publicado em 1930 “Cidade do Rio de Janeiro: Remodelação, Extensão e Embelezamento”. Concorreu em 1911 ao Concurso para a capital da Austrália (Camberra) tendo obtido o 3º lugar.
O esquema de Agache para a área central do Rio de Janeiro teria um formato aproximadamente triangular. A base do triângulo, a Avenida Rio Branco, e o eixo inclinado, a Avenida Mem de Sá, já existiam, fruto dos trabalhos de Pereira Passos. Agache propôs o terceiro lado do triângulo, o eixo vertical, que seria um super boulevard (a futura Avenida Presidente Vargas) conectando a Praça da Bandeira com o porto e cruzando a área mais densa do centro. A Igreja da Candelária já aparecia intacta no meio da avenida.Agache procurou criar um monumental espaço para as paradas cívicas e comemorações, o qual afirmasse o poder da nação. Para criar essa praça, Agache propôs um grande aterro retificando a costa, cujo material viria da prevista demolição do Morro de Santo Antônio. A influência do Plano do Centro Cívico de Chicago de Daniel Burham é muito evidente e pode ser vista em muitos pontos do conjunto.Havia um crença de que a criação de conjuntos urbanísticos poderia subordinar os indivíduos ao poder nacional, ao interesse geral de uma sociedade moderna e organizada. O papel do urbanista seria o de ajudar a concretizar essa imagem, criar um vocabulário para expressar essa ordem e fazer esses valores aparentes.De acordo com David Underwood, os conjuntos monumentais de Agache refletem seus interesses pela sociologia, particularmente as teorias de Durkheim. Ele idealizou bairros da Zona sul para a elite e os subúrbios para os bairros operários, garantindo grande distância com o Centro de poder.Segundo o plano de Agache, a Praça do Castello iria ocupar o vazio deixado pelo arrasamento do Morro do Castello e seria cortada por três avenidas, uma delas proveniente da Entrada do Brasil, a Avenida Santos Dumont, resultando em um conjunto de formato heaxagonal.Se, na cidade medieval, a catedral era a suprema expressão da alma de uma comunidade, marcando sua silhueta e concentrando suas aspirações artísticas e religiosas, aqui os novos conjuntos de edifícios expressariam as novas forças da era moderna.Esses padrões provaram ser muito influentes para a remodelação das cidades brasileiras durante o Estado Novo, notadamente Recife e Porto Alegre.

Ao contrário do “Rei do Samba”, Agache se referia às favelas como “lepras” e “chagas”. O elevado custo financeiro e a Revolução de 1930, que levou Getulio Vargas ao poder, contribuíram, porém, para que seu projeto fosse arquivado. O governo de Getulio deixou as favelas em paz por algum tempo e chegou a defender, em determinadas instâncias, os seus moradores contra as ações dos proprietários de terrenos. Isso, decerto, reforçava a imagem do presidente como “pai dos pobres”.
O Código de Obras da cidade, de 1937, mostrou que essa situação era provisória. Entre seus objetivos estava a eliminação das favelas, em cujas casas era vedado qualquer tipo de melhoramento. Essa foi a primeira política formal de governo referente às favelas. Na Primeira República, a fiscalização e o conhecimento delas ficara a cargo da grande imprensa, que denunciava o surgimento de barracões e casebres, apontava para o adensamento populacional nos morros e pedia providências a esse respeito. Agora, os poderes públicos entravam em cena, para melhor conhecer as favelas e controlá-las.
Relatório elaborado para a prefeitura pelo médico Victor Tavares de Moura – “Esboço de um plano para o estudo e a solução das favelas no Rio de Janeiro”, 1940 – é ilustrativo de como os morros eram vistos como um problema moral: “A vida lá em cima é tudo quanto há de mais pernicioso. Imperam os jogos de baralho (…) e o samba é diversão irrigada a álcool. Os barracões (…) abrigam, cada um, mais de uma dezena de indivíduos (…) em perigosa promiscuidade”. O médico defendia medidas como o controle da entrada de indivíduos de baixa condição social no Rio de Janeiro e o retorno deles para seus lugares de origem.
