Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 15% dos casais sofrem com a infertilidade. No Brasil, a estimativa é que 278.000 tenham dificuldades para gerar filhos. Se diagnosticado a tempo, entretanto, o problema pode ser contornado. O especialista Renato Fraietta, do setor de reprodução da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica por que a infertilidade acomete casais e como combatê-la.
A incapacidade que um casal apresenta para gerar um filho é decorrente, em 30% dos casos, de algum problema do homem, em outros 30%, da mulher e, em 40% das vezes, de ambos. Vários fatores podem causar a infertilidade feminina: em 30% dos casos, a mulher apresenta problemas de ovulação; na mesma taxa, são registrados distúrbios nas tubas uterinas ou na trompa, além de endometriose, doença que afeta principalmente aquelas que têm cólicas fortes. Entre os homens, os principais causadores da infertilidade são a varicocele, em que varizes nos testículos aumentam a temperatura e diminuem a produção, qualidade e quantidade dos espermatozóides; a criptorquidia, doença em que o testículo nasce fora da bolsa testicular; e infecções como a causada pelo vírus da caxumba, que pode atacar o testículo e afetar a produção de espermatozóides.
Recentemente, chegou ao Brasil uma técnica que permite aumentar a chance de gravidez na primeira tentativa — que, nas melhores clínicas, não passa de 30%. O embrião é cultivado em uma substância que reproduz as condições das trompas, o que permite que ele seja implantado na mulher até cinco dias após a fecundação. Mais maduro, tem mais chance de se fixar na parede do útero. Antes, o óvulo fecundado agüentava no máximo dois dias fora da barriga da mãe. Como os casais que procuram a fertilização artificial têm grande dificuldade para engravidar, os médicos estão também trabalhando firme em exames para garantir que a fecundação tão esperada possa ser feita com um feto que tenha saúde total. O que está perto de se conseguir é garantir aos pais uma criança saudável, livre de doenças congênitas e malformações. Um recurso não disponível nas gestações naturais, já que, nesses casos, é impossível selecionar o embrião.
Um desses exames é o diagnóstico genético pré-implantação, conhecido como biópsia do embrião. Depois de fertilizado o embrião, retira-se uma das células para análise de até sete tipos de cromossomos diferentes. Doenças como hemofilia e síndrome de Down, entre outras, podem ser detectadas nesse exame. E então são transferidos para o útero apenas os embriões saudáveis. Na opinião do ginecologista Paulo Serafini, especialista da área de fertilização assistida e diretor da clínica Huntington, no Espírito Santo, “nos próximos cinco anos vamos conseguir mapear totalmente o embrião e garantir que aquela criança será totalmente normal. Será um grande alívio para os pais”.
Agora que domina a técnica da fertilização, a ciência se dedica a aprimorá-la, o que significa reduzir o número de embriões implantados, para diminuir o risco de gêmeos. À primeira vista, uma gravidez múltipla pode parecer um prêmio aos olhos dos pais. Na verdade, pode representar um grande risco para a vida da mãe e dos próprios bebês. “A competitividade leva os profissionais a implantar até dez embriões, para aumentar a chance de sucesso”, afirma Serafini. “Isso acaba aumentando a ocorrência de gêmeos.” No Brasil, são realizadas por ano 3.500 tentativas de conseguir um bebê por proveta. Nos Estados Unidos, esse número é dez vezes maior. É ainda muito pouco, mas há um grande empecilho para o aumento do número de tentativas: o preço. A fecundação através de proveta custa por volta de 6.000 reais. Como a chance de um tratamento ser bem-sucedido é de 25%, o casal pode esperar um investimento financeiro pesado. Não só financeiro, mas um investimento de tempo também. No espaço de dez anos, a psicóloga paulista Marisia Gualtieri, 36, submeteu-se a dez tentativas de inseminação artificial e três de fertilização in vitro até a chegada de Pedro, hoje com 2 anos e meio.
Até um tempo atrás, as mulheres obrigavam-se a orientar suas vidas por um relógio biológico implacável, cujos ponteiros a avisavam de que o momento de ter filhos tinha hora para acabar. A partir dos 35 anos, as possibilidades de engravidar caem para em torno de 60% do que eram aos 25. Aos 40 anos, a mulher tem apenas cerca de 50% de chance de ter filhos. Um dos grandes benefícios da fertilização assistida é permitir à mulher que queira ter filhos atrasar o projeto até o limite. Ou seja, se a natureza lhe nega esse direito, a medicina pode ajudá-la. No momento em que a mulher investe na carreira, quer ascender a cargos mais altos, ter filhos não deixou de fazer parte dos seus planos, mas ficou para mais tarde. Uma gravidez aos 20 ou 25 anos pode ser inoportuna. Para um em cada cinco casais que não conseguem ter filhos, a fertilização assistida também é a única esperança.
Em torno da fertilização assistida, no entanto, há algumas questões a ser lembradas. Uma delas é a angustiante “redução”. Ela acontece quando a mulher recebe um número alto de óvulos fecundados, todos vingam, mas é melhor retirar alguns para aumentar a chance de sobrevivência dos que ficam. É um procedimento proibido pelo Conselho Federal de Medicina, mas ainda assim praticado em algumas clínicas particulares. Uma segunda questão em torno do tema é o desgaste psicológico quando o projeto fracassa, problema levantado normalmente por psicólogos e psiquiatras. A medicina ajuda bastante, mas não faz milagres e existem alguns casos sem solução.